segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Coração

Tudo começa com o pulsar de um coração. Tudo começa, aliás, com a força da manivela que dá corda ao coração, que bombeia por vasos mirrados sangue fresco, envelhecido como quem o suporta dentro do corpo, sempre em constante mudança irreal, sofrendo transformação atrás de transformação só para se refazer
qual a dor que deve sentir
ao explodir para se transformar, só porque
sim.

"Nem sequer valeu a pena"
Alfinete de cabeça curta, que se insere por debaixo das cicatrizes de pele mal sarada.

"Parece que só piorou", como poderia, se sem dares à corda o coração não anda?
Lembra-te, tudo começa com ele, a bombear cada vez mais lentamente o sangue escuro e podre por entre os caminhos do corpo. Tudo arrefece.


"Agora estás a dizer que a culpa é minha?"

dos dedos escorre sangue negro, às golfadas. É impossível respirar.

"Nem sequer valeu a pena", o batimento interrompe-se aos soluços, por entres respiração ofegante de um órgão fugitivo, preso por entre costelas.
Quer dera que explodisse, para que pudesses saber o quão ferido está neste momento.

Não valer a pena é sujo. Não valer a pena é negro, buraco fundo, túnel sem luz, corredor assustador de onde nunca se sai. Rodopio de tempo entre os dedos e o sangue do corpo.


Engraçado. Não valer a pena parece-se muito com o ser. Pelo menos com a maneira com se é.
Para quê bombear o que está condenado a definhar sem ar, luz,

sangue
vísceras
entranhas
............... pequeno corpo desmembrado.
Ele (o coração, sabes?) morre um pouco mais lá dentro da sua jaula de costelas. Esqueleto branco. Sangue vermelho.
Alma negra como o céu.

Tudo acaba com um coração.

2 comentários:

  1. Gostei muito do teu blog e a música é fantástica! Muitos parabéns!

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  2. Portentosa escrita, magníficas composições, belíssima descoberta!

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