Minutos para o anoitecer.
Agigantava-se
a maré de nevoeiro, que anunciava uma descida inesperada da temperatura.
A
porta vibrou, mal toquei à campainha. Ponderei há quanto tempo estaria parado
ali atrás, de pé. À minha espera.
A
luz morta dos elevadores nunca me tinha parecido atraente. Sempre que lá ia,
era a primeira coisa que me avisava que, talvez, devesse voltar para trás.
A
primeira noite em que visitara Charlie seria também a última em que punha os
pés num elevador. O barulho das roldanas, o cheiro a mofo, a luz a piscar no
teto.
O
espelho baço, onde vi refletida a minha face. Rímel. Maquilhagem preta nos
olhos, algo carregada.
O
que vi... Esse foi o aviso número dois.
Escadas.
Ele
já não me esperava por detrás da porta, como fizera no primeiro mês. Não
precisei de me anunciar.
- Pizza?
Há
muitas formas de fazer perguntas. Ele costumava tentar alimentar-me para não
ver a resposta nos meus olhos.
- Obrigada - não comi. Em vez
disso, fiquei a observá-lo. Estava embriagado.
- Tu sabes... sabes que és única!
Entendes-me, naquelas situações.
Ia
ser uma longa noite.
- Estás bêbado.
- Não! Há nitidez naquilo que digo,
entendes-me?
- Sim.
Fatia
de pizza na mão. Boca repleta de migalhas.
- Vamos para a cama.
Que
maneira crua de dizer a alguém que a quer amar.
- Não estás bem.
Não
era uma pergunta.
- Estou ótimo.
Não era uma resposta.
Não era uma resposta.
Vou-me
embora.
"Por
favor. Fica."
Quem
nunca ouviu um apelo doloroso da alma, nunca saberá porque é que fica parado no
mesmo sítio, quando o que realmente quer é ir embora.
Aviso
número três.
Fiquei.