segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Fá (3)

De partida, hoje, como já muitas vezes. De partida, para voltar, claro, volto sempre, nunca me abandono a uma ideia de permanecer fora, distante, sem nada a que me agarrar.
Hoje, hoje é diferente, porque parto para longe de ti, Fá, minha nota musical de sustenidos, minha nota musical da perfeição. É para longe de ti que parto, sim, mas é bom partir, porque na partida recordamos quem nos espera ao regresso, e quem me espera és tu.
Parto, sim. Mas volto, volto logo. Porque me conseguiste prender em ti mais do que esperei, porque sei que me esperas.
Volto logo, fica descansado. Espero que durmas bem esta noite.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Ré (1)


É que estão mesmo perfeitos. Os cortes.
Puxo a manga mais para baixo, prendendo com força lábios traiçoeiros dos quais desejam escapar palavras desconhecidas.
Sou desastrada. Estou sempre a ir contra as coisas.
O olhar que lanças demora pouco mais do que segundos, já estamos ambos a pensar noutra coisa, completamente diferente, completamente distante de qualquer segredo que possamos ter. Desvias os olhos e encho-me de alívio de que não vejas como outros vêem. Não há repulsa nem medo, nem compreensão. Só um assentimento mútuo de não dizer palavras, de não apresentar conjeturas, de não esforçar para perceber o que não pode ser compreendido.
Olha, sei que não sabes o que passa a esvoaçar na minha mente, mas não faz mal, porque é mesmo assim que deve ser.
Porque se não, olha, ia magoar, essa tua afirmação irrefletida.
Mas não magoou.
Foi como uma brisa de fim de tarde, algo gelada nos ossos, mas algo quente por dentro.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Amor. Conheço a palavra, atuo como quem não sabe, desconheço o significado. E perturba-me, perturba-me muito, não ser capaz de distinguir, de ler entrelinhas, de compreender de onde surgem os sentimentos.
Perturba-me, mas rapidamente me esqueço deles.
É só quando abro o livro, quando me deixo levar numa viagem, que me volta ao pensamento, subitamente, como uma brisa de verão com o peso de um vendaval.
Não sei o que é, olha, desculpa, mas o que devo sentir? Não te aproximes.
Olha, gosto de sorrir de longe, é assim que eu amo, de longe, sempre, no escuro, nos bastidores. De perto não, nunca, não sou capaz. Mantenho-me na sombra e deixo que seja o meu olhar a refletir a luz.
Mas os meus olhos? Nunca. Não têm luz suficiente que não seja apagada pela minha própria incapacidade de atuar e de perceber.
Olha, eu observo. Deixa-me suspirar.
De longe. Só de longe.

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012


Não deixo que vejam o mundo pelos meus olhos, porque está desfocado e não tem zoom.
"O que é que isso quer dizer?"
Quer dizer que afasto de mim tudo o que é belo e tudo parece virado do avesso...

sábado, 18 de fevereiro de 2012

quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012



Oh, corpo, como és pesado! Olha, como te quis deixar, hoje, deitado no chão frio, como te quis abandonar e sentir-me leve, como quis cheirar todos os cheiros, ouvir todos os sons e esquecer aquilo que me puxa para baixo. Como quis roer a corda e perder-me longe, longe de mim, longe da mesma face que me faz desviar os olhos do espelho, longe dos mesmo braços marcados, longe do espírito corrompido.
Queria deixar-te, corpo, porque não te quero mais perto de mim, a segurar-me. Quero deixar-te para tentar perder-me só e num lugar inexistente.
Por favor, não me chames ainda de volta, voz. Olha, deixa-me sonhar acordada só mais um bocadinho.
Porque, quando voltar, acho que já não vou conseguir lidar mais com este peso.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

As noites são mais frias que os dias, mais escuras, mais assustadoras. E ela costumava achar engraçado como as sombras se entrelaçavam nos seus dedos quando ia dormir, e as pequenas luzinhas do relógio cantavam as horas num silêncio falador, que a embalava.
Agora, já não acha piada, pois descobriu essa faceta gananciosa da noite, a que rouba a luz, a que leva a lua e faz temer que o sol não nasça. Aquela faceta que amarra à cama, acorrenta uma alma e tira o brilho a um olhar, que fica marejado de lágrimas. Aquela faceta que sussurra incapacidades e vergonhas, medos e falhas. Tantas, tantas.

E ela fica muito quieta, só a ouvir a sua respiração, e a pensar nas suas histórias, em contos de outras eras, em maravilhas desconhecidas, que a ela são estranhas, mas com as quais sonha acordada. E, durante a noite, vive um pesadelo melodioso e atraente, do qual não quer acordar.

Olha, como deseja, entre suspiros calados e uma respiração entrecortada por lágrimas, aquele contacto doce de uma alma amiga.
Olha, sol. Preciso de um abraço.

domingo, 12 de fevereiro de 2012

Fá (1)


Parece-me que me faz bem, a tua companhia, as tuas palavras. Fazem-me bem as conversas despreocupadas, de coisas simples. Fazem-me bem as caminhadas, as corridas.
Fazem-me bem as tuas palavras, sim. Acima de tudo, fazem-me bem as tuas palavras

sábado, 4 de fevereiro de 2012


Foi mais do que esperava, um passeio à praia acompanhada pelo Sol, pela Dó e pelo Ré. O barulho das ondas, os risos e as brincadeiras envolveram-me e senti-me bem, como já não me sentia à muito tempo. Mais eu, mais minha, mais deles. E senti, de forma impossível de descrever, o que é amizade quando percebi que, Sol, pões tanto de parte para estares comigo e me veres sorrir.
Sabem, minhas três notinhas de música, é fim de semana e tenho saudades vossas, mas de certeza que foi a melhor forma de acabar a semana possível, o nosso passeio.
Hoje, olhem, continuo com medo de afastar o Sol, de magoar a Dó e o Ré, mas nenhum deles parece tão longe de mim.
Cuidado, que a esperança engana, engana muito e envolve-nos num sonho acordado. Mas, olhem, vou sonhar mais um bocadinho. Só mais um bocadinho.

sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Sol (3)

Porque perguntas? Que necessidade tens de perguntar se sabes a resposta para as tuas perguntas? E, olha, ninguém precisa de perguntas, só de respostas, de alguém que lhe indique o caminho, aliás, olha, só preciso de uma saída.
Não sei porque não te respondi, embora pense que sim. Olha, acho que se chama medo. Medo de não controlar tudo, como é meu costume, medo de me sentir pequena, mais pequena do que sou; medo de não conseguir esconder; medo de precisar de um abraço e não poder pedir. Por medo. Foi simplesmente por isso.

E, olha, já é força do hábito afastar aqueles que se preocupam e dói-me, dói-me pensar que vou fazer o mesmo contigo, por isso, desde já, desculpa.
Eu sei que entendes.


sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

A casa vazia, o cheiro a betadine no ar, misturado com o cheiro férreo a sangue.
Ela senta-se, muito quieta, a observar as gotas a descerem pela pele.
Depois, enfia-se na banheira e fica a ver a água a cair. E pensa, durante muito tempo, que se sente melhor. Sim, sente-se melhor, naquele momento.
Mas tem a certeza absoluta de que, no dia seguinte, vai começar tudo outra vez.
E, olha, ela fica triste e pensa que, no final, toda a gente vai acabar por desaparecer, numa nuvem de ilusão.
Porque ninguém gosta de brincar com brinquedos partidos, ninguém se incomoda a colocar-lhe uma ligadura.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Sol (2)

E, olha, deixa-me contar como me sinto. Deixa-me dizer-te como é difícil acordar todas as manhãs, levantar-me e vestir-me, como é algo complexo e irracional o medo que me invade e o sentimento sem nome que se enrosca em mim.
E, olha, depois deixa-me pensar naqueles dias em que trocamos ideias absurdas e comentários fora de contexto; deixa-me pensar naquelas situações em que colocas música a tocar e eu me deixo absorver, de olhos fechados; deixa-me pensar nos momentos em que leio e me sinto, durante um pouco, em paz.
E, olha, por fim, deixa-me pensar na forma como te preocupas comigo. E não é justo para ninguém que eu não me esforce, que fique na cama, que não me levante. Por isso, olha, dá-me a mão e leva-me contigo.
E obrigada, meu amigo.


sexta-feira, 20 de janeiro de 2012



E, olha, gosto de fechar os olhos durante um bocadinho, quando te despedes de mim porque impede-me de pensar que só volto a estar acompanhada daqui a dois dias.
E permite-me guardar em segredo as lágrimas, porque não quero que fiques triste, sabes? E acho que isso é, verdadeiramente, a única coisa que me impede de te pedir que fiques comigo mais um bocadinho e que me oiças chorar.
Boa noite, meu amigo.

domingo, 15 de janeiro de 2012



E perguntaram-me se estava tudo bem. E disseram-me para ter calma com testes, notas, com a minha vida que ainda não vivi e que, por vezes, nem tenho vontade de viver. E pegaram-me nas mãos, e eu temi que conseguissem sentir feridas por sarar, não só na pele mas no espírito.
Mas, olha, a verdade é que não sentiram, não se aperceberam. E eu aceno com a cabeça, faço-me mais presente e finjo apreciar as conversas que se desenrolam à minha frente e digo:
Estou bem.
E já repito isto há tanto tempo que, às vezes, me parece que talvez possa ser verdade. E depois, tão depressa como o vento passa a briza, volto a recolher-me para o mais fundo de mim e penso não é verdade. Não estou bem. Mas não sei falar sobre isso. Não QUERO falar sobre isso.

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Sol (1)


Olha bem para mim, talvez consigas ver como me sinto quando brincas com coisas sérias. Olha com toda a tua atenção porque, às vezes, esqueceste de olhar, esqueceste e magoas.
Porque falas de coisas que devias manter caladas, porque dizes coisas da boca para fora que ferem. E olha, acredita em mim, eu sei como ferem as palavras, eu sei muito bem.
Mas, sabes? Não consigo ficar zangada contigo, porque, embora não saibas o que se passa, preocupaste, e apesar de tudo, confio em ti.
Olha, se calhar devia dizer-te como me sinto, devia olhar-te nos olhos e dizer-te: "Abraça-me, hoje não me sinto bem". Mas não sou capaz, e fico-me por te ouvir a brincar com coisas sérias e pensar, por entre os risos que provocas em mim que lá no fundo, bem no fundo, magoa um bocadinho. Magoa sempre um bocadinho. Mas gosto muito de ti, meu amigo. Por isso, não faz mal. Eu esqueço, eu ignoro. Já sei como se faz.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Às vezes, impressiono-me com a forma como te saem as palavras, de tal modo que pareces preocupado comigo, de tal modo que me fazes sorrir. Olha, Sol, não estou habituada, mas afastas as lágrimas durante um bocadinho, e já é suficiente.
Olha, parece-me estranho como reparas em mim mais do que eu mesma, como vês, mesmo que não tas mostre, as minha cicatrizes e me perguntas porquê; como me pegas no casaco para que não apanhe frio; como me fazes rir, com vontade;

como me abraças quando preciso, mesmo que eu mesma não o admita; como me dizes "vê se dormes bem".
Obrigada, Sol. Obrigada mesmo.
Boa noite, meu amigo.

segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

"Essa sim, é a Catarina que eu gosto de ver. Eras tão sorridente! Por isso é que estou sempre a dizer, sorri, rapariga! Não é?"
Ó avô desculpa. Desculpa-me por não ser capaz de mentir melhor, de sorrir melhor, por não ser novamente aquela criança pequena que era incapaz de ser humilde e que estendia os braços para as prendas de natal e fazia de conta que tocava violino da pior forma possível. Desculpa, avô. Eu queria ser essa menina, sabes? Mas é tão difiícil, quando choro até adormecer e sinto que tudo desaba à minha volta! Desculpa, avôzinho... Desculpa.
" Pois é, avô. Tens toda a razão!" - e ela sorri, consciente de que todos sabem que está algo de errado com o sorriso dela, mas que é boa a fingir, e que amanhã já ninguém se lembrará de nada.
E assim começa mais um ano...